segunda-feira, 14 de março de 2011

Farmácia do SAMS II

Indignada, mas nem tanto:
- Eu odeio massa, odeio polenta, odeio qualquer tipo de doce, só gosto de arroz e feijão. Mesmo assim, diabetes.
- Você foi no médico?
- Fui em São Paulo, o médico indicou os exames e tava lá, diabetes.
Pensou um segundo.
- Eu nem sabia que tinha essa coisa de diabetes. Você vê, quem procura acha: fui procurar e achei.
Sorriu.
A fila andava lenta, de um em um...

Farmácia do SAMS I

Batendo com o indicador no meio do peito:
- A máquina aqui não tá muito bem.
- Coração?
- Um monte de coisa, fio, já tenho mais de 70 anos.
O homem a minha frente na fila olhava de canto de olho, com certeza nossa conversa o incomodava.

Todo o caminho

Enquanto esperava na praça
Vi uma dessas lagartas de palmeira atravessar ondulantemente a praça toda, de um lado até o outro.
Durante todo esse tempo o sol subiu e secou o orvalho que estava sobre grama.
Um anu preto pousou no banco, bicou a lagarta e a levou embora.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

A miséria tá foda

Com seu carrinho de supermercado foi até o balcão. Contando as moedas que acabara de ganhar de alguém pediu:
- Me dá duas fatias de queijo?
- DUAS fatias?
- É, dona, a miséria aqui hoje tá foda.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Pra dormir

- Moço, você não pode dormir aí.
A garçonete do restaurante vegetariano sorri preocupada pro mendigo que, sem graça, pede desculpas, se levanta e vai pegando sua coberta e seu papelão.
De longe outro mendigo grita:
- Joga água nele! Joga água nele!
A garçonete, já na porta do estabelcimento olha e sorri meio sem jeito:
- Não, não vou jogar água não.
O outro mendigo continuou sua procura por um lugar pra dormir.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Seus males espanta

Enquanto eu tocava a gaita ele apareceu na minha frente, parado, mudo, preto e com os músculos pequenos mas definidos. Segurava a camisa com as mãos e, com os dedos fazia um movimento de alguém que limpa uma poeira sobre o ombro.
Fiquei assustado com a forma com que ele me olhava profundamente, sem piscar ou mexer a cabeça. Para não demonstrar medo eu comecei a assoprar e puxar minha gaita, dando continuidade à música alegre que estive tocando até então.
Ele fechou os olhos e bambeou a cabeça para trás, mexeu as pernas, mexeu os braços, dedilhou na sua camiseta suada e começou a levantar os braços e a rebolar ao som do blues.
Aquilo tudo foi muito estranho.
Por fim, ele agradeceu com um grunhido estranho e foi incomodar os passantes.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Sentado na calçada, debaixo da árvore, ele mastigava alguma coisa grande.
Toda a atenção foi voltada para o que mastigava.
Seus olhos estavam abertos, fixos e secos, como a pele dos seus pés.